Sobre a paz

No ano de 1932, Albert Einstein escreveu uma carta a Sigmund Freud, em nome do Comitê Permanente para a Literatura e as Artes da Liga das Nações, sobre o tema da guerra. Nessa carta, Einstein perguntou a Freud se ele considerava que houvesse “alguma forma de livrar a humanidade da ameaça da guerra” e se seria “possível controlar a evolução da mente do homem, de modo a torná-la à prova das psicoses do ódio e da destrutividade”1. Freud respondeu-lhe de forma realista, com base na sua teoria psicanalítica, que “não havia maneira de eliminar totalmente os impulsos agressivos do homem”, mas que seria possível “tentar desviá-los num grau tal que não necessitassem encontrar expressão na guerra”2.

Logo depois, na mesma carta, Freud perguntou a Einstein: “por que o senhor, eu e tantas outras pessoas nos revoltamos tão violentamente contra a guerra, mesmo sabendo que o instinto de destruição e morte seja inseparável do instinto erótico do homem?”. E respondeu, para si mesmo, “que a principal razão por que nos rebelamos contra a guerra é que não podemos fazer outra coisa. Somos pacifistas porque somos obrigados a sê-lo, por motivos orgânicos, básicos […], temos uma intolerância constitucional à guerra, digamos, uma idiossincrasia exacerbada no mais alto grau”3.

O organizador deste livro também considera que a guerra é um fenômeno permanente e incontornável da história humana. Mas, ao mesmo tempo, acredita que as sociedades humanas compartilham uma “utopia ética” e que as “grandes guerras” possuem uma “teleologia ética” que vai sendo tecida através de sucessivos “acordos” e “tratados” normalmente impostos pelos “vitoriosos”, mas depois questionados e revistos pelos “derrotados”, em uma sucessão perene de novas guerras, como já nos havia ensinado a dialética realista e cética do filósofo grego Heráclito de Éfeso (521-487 a.C.).

Estão reunidos aqui 14 ensaios, além de um prefácio sobre a origem da pesquisa e de um posfácio sobre a raiz lógica e mitológica do “ceticismo ético”, indissociável do pensamento realista4. Todos os autores desenvolveram suas reflexões livremente, partindo de uma pergunta e de uma hipótese comuns que unificam e organizam o livro. Por isso mesmo, quase todos os textos deste livro contrapõem o “nome da paz” ao nome das “grandes guerras” que as precederam, e que estiveram na origem das várias “ordens internacionais” que se formaram através dos tempos, desde que foi assinado o primeiro “tratado de paz” da História, entre duas grandes potências – o Reino do Egito e o Império Hitita –, depois da Batalha de Kadesh, em 1259 a.C.

Sobre a Paz se segue à publicação de Sobre a Guerra, também editado pela Editora Vozes, em 2018. Os dois livros fazem parte de uma pesquisa que vimos desenvolvendo, há vários anos, sobre o tema da guerra, da paz e da ética internacional, dentro dos Programas de Pós-Graduação em Economia Política Internacional (PEPI) e em Bioética, Ética Aplicada, e Saúde Coletiva (PPGBIOS), da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

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José Luís Fiori

Formado em Sociologia e Economia Política pela Universidade do Chile. Doutor em Ciência Política pela Universidade de São Paulo, com pós-doutorado em Economia Política pela Universidade de Cambridge. Professor titular (aposentado) e professor permanente de Economia Política Internacional do PEPI/UFRJ. Coordenador do grupo de pesquisa Poder Global e Geopolítica do Capitalismo, do PEPI/CNPq, e do Laboratório de Ética e Poder Global do NUBEIA/UFRJ. Organizou os livros “Poder e Dinheiro. Uma economia política da globalização”, junto com M. C. Tavares, em 1997, “Poder Americano”, em 2004 e “Sobre a guerra”, em 2018, pela Editora Vozes. Publicou, entre outros: “Poder Global e a Nova Geopolítica das Nações”, em 2007, “História, Estratégia e Desenvolvimento”, em 2014, pela Editora Boitempo e pela Editora Vozes publicou “A Síndrome de Babel e a disputa do poder global”, em 2020.


  1. Freud, S. Novas Conferências Introdutórias sobre Psicanálise e outros trabalhos (1932-1936),
    vol. XXII. In: __. Edição Standard Brasileira das Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud.
    Rio de Janeiro: Imago Editora, 1969.
  2. Freud (1969, p. 217).
  3. Freud (1969, p. 218-220)
  4. Agradeço a contribuição decisiva de Ana Silvia Gesteira, na leitura e edição de todos os textos deste livro e na sua organização final para envio para a Editora Vozes. E de forma particular, a Maria Claudia Vater, que acompanhou com dedicação toda a pesquisa e construção desta reflexão sobre a paz.