Os mitos egípcios

Por: Thomas Henrique de Toledo Stella

Os mitos egípcios_
Os mitos egípcios

O livro “Os mitos egípcios: um guia aos antigos deuses e lendas”, de Garry J. Shaw, foi lançado no Brasil pela Editora Vozes, que o publicou numa série junto dos Mitos Celtas, Nórdicos, Gregos e Romanos.

A coleção visita as tradições religiosas pré-cristãs que formaram a cultura ocidental antes que ela fosse praticamente unificada sob a crença oficial do Império Romano: o cristianismo. Infelizmente, há poucas publicações sobre o Antigo Egito com a devida qualidade em língua portuguesa, o que faz com que essa decisão editorial seja alvissareira.

Logo na introdução, o livro começa com as perguntas existenciais que praticamente todas as religiões se propuseram a responder e apresenta a cronologia e as fontes para se estudar as tradições espirituais do Antigo Egito.

A primeira parte tem 4 capítulos. O primeiro trata das cosmogonias. O Antigo Egito possuía diversas tradições coexistindo, com cada qual atribuindo às suas divindades um papel na criação do cosmos. Mas elas possuíam elementos comuns. Por exemplo, a noção de Num, as águas primevas; e a oposição entre Maat (a ordem) e Isefet (o caos). Cada cosmogonia tinha o próprio demiurgo que criava cosmos. Isso era feito a partir de outro elemento central da crença egípcia: heka, ou magia.

De todas as cosmogonias, a mais influente era a de Heliópolis do culto a Rá (traduzido como Rê). Ela ganha destaque no livro, com o segundo capítulo explorando os mitos desse Deus-Sol. Do céu, parte ao submundo, no reinado de Osiris. Numa civilização que construía sepulturas monumentais como as pirâmides de Giza, ou suntuosas tumbas como as do Vale dos Reis, o estudo do além-vida tem a merecida atenção no terceiro capítulo. Já o quarto explora a contenda de Hórus e Seth, pois dessa luta surgirá o primeiro faraó, sendo ele mesmo um deus.

Na segunda parte, o livro esmiúça como vivem os deuses e como os humanos se relacionavam com eles. Analisa a influência do contexto geográfico, o sincretismo entre os próprios egípcios e com outras culturas como os gregos e também como se davam as atividades nos templos e na vida religiosa cotidiana das pessoas. Novamente, um elemento da espiritualidade egípcia vem à tona: a magia, ou heka, agora não praticada apenas pelos deuses, mas também por aqueles que movimentavam forças cósmicas em busca de um objetivo, independente da classe social.

A terceira e última parte analisa a literatura funerária egípcia. Conceitos dos Textos das Pirâmides, dos Textos dos Sarcófagos e do próprio Livro dos Mortos são visitados. A passagem do morto faz sentido quando se busca tornar um Akh, ou seja, completar a jornada pela imortalidade.

O livro tem ainda um epílogo que cita um trecho do “pequeno apocalipse egípcio”, de Hermes Trismegistos. Ele conclui que por serem obcecados pela imortalidade, os egípcios de alguma forma a alcançaram. Afinal, essa civilização continua influenciando a humanidade.

Em suma, “Os mitos egípcios” de Garry Shaw foi uma feliz escolha da Editora Vozes para ser traduzido ao português. O livro é introdutório sem ser superficial. Ele é equilibrado nas citações das fontes, o que abre a possibilidade para se aprofundar. Portanto, é um livro recomendado aos que queiram desfrutar do universo da espiritualidade egípcia antiga. Ao mesmo tempo é científico, mas também respeitoso com essa tradição que, de algum modo, alcançou sua imortalidade.

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Thomas Henrique de Toledo Stella é doutorando em Arqueologia pelo Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo (MAE/USP) com bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Mestre em Desenvolvimento Econômico pelo Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (IE/Unicamp) com bolsa da Fundação de Amparo à Pesquisa no Estado de São Paulo (FAPESP) e do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Pós-Graduado em Antigo Egito pelo Instituto de Estudos do Próximo Oriente Antigo da Universidade Autônoma de Barcelona (IEPOA/UAB). Graduado em História (Bacharelado e Licenciatura) pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP). Foi pesquisador visitante da Universidade da Califórnia Los Angeles no Departamento de Linguagens e Culturas do Oriente Próximo (NELC/UCLA), professor da Faculdade de Campinas (FACAMP), da Universidade Paulista (UNIP), da Universidade Salesiana (UNISAL) e da Faculdade Anhanguera. Atualmente, pesquisa a economia do Antigo Egito na geopolítica do colapso da Idade do Bronze.