Noite Escura, por São João da Cruz

Para explicar as Canções da Alma e descrever os efeitos produzidos no interior daqueles que passam pela experiência da contemplação, por meio das duas purificações espirituais, é que João da Cruz escreve Noite Escura. O autor carmelita é reconhecido como Doutor da Igreja Universal, pois sua obra influenciou grandemente a espiritualidade cristã. Entusiasmado por Tereza de Jesus e por seu desejo pessoal de vida austera, Joao da Cruz, inicia a reforma de sua Ordem, o que lhe faz passar por perseguições e ser encarcerado. Contudo, é nesse período de provação e sofrimento que nasce sua obra espiritual, manifestada na poesia.

Neste sentido, a união com Deus é o alvo da Noite Escura, pelas quais passam as almas. Essa noite é entendida como um processo de purificação, que produz na alma a negação de si e de todas as coisas. Assim, as canções são ditas pelas almas que se encontram já na perfeição, isto é, as almas que já estão na união com Deus. Na Noite Escura é Deus o condutor da alma; Ele, por sua graça faz a pessoa sair do estado dos principiantes e a insere no estado dos perfeitos. Esta Noite fortalece e confirma as virtudes, trazendo bens à alma, limpando-a e purificando-a.

De acordo com o Doutor Místico, nesta Noite as almas experimentam duas espécies de purificação, uma sensitiva e outra espiritual. A primeira ocorre em muitas almas, já a segunda sucede em poucas; enquanto a sensitiva é amarga e terrível a espiritual é horrenda e espantosa. Estas duas noites são também conhecidas como trevas. Na Noite Escura, nessa experiência das duas purificações, é desejo de Deus levar adiante os iniciados na vida espiritual, assim Ele os ergue e liberta, fazendo-os experimentar um desapego. Securas, vazio interior e uma inflamação da alma, caracterizam o estado das pessoas que passam pela Noite.

João da Cruz, para explicar o processo de união da alma com Deus, serve-se de uma metáfora: a ação do fogo na madeira. Assim Deus eleva e une a alma a si, inflamando-a de amores e de grande desejo por Ele. A Noite traz à alma vários e grandes proveitos, entre eles o de conhecer-se profundamente, reconhecendo sua miséria e crescendo na humildade. Contudo, apesar das trevas produzidas na alma, nesta Noite, ela é elevada, mesmo que não perceba, pois a Noite age silenciosamente. A Noite Escura é, por fim, uma escada, que induz a alma a escalar e galgar os tesouros dos céus.


Leonardo Henrique Agostinho, MSC
Religioso da Congregação dos Missionários do Sagrado Coração,

formado em Filosofia e estudante de Teologia, na PUC-SP.