De Cive - Elementos filosóficos a respeito do cidadão
Por: Delmo Mattos
A publicação do De Cive ou Do Cidadão, por Hobbes, em 1642 em Paris, favoreceu a uma reorientação das suas perspectivas filosóficas. No Prefácio ao De Cive, Hobbes menciona o seu abandono pelos estudos da física para refletir sobre as questões de política mais cedo do que planejava. Trata-se, portanto, de um novo ponto de partida das suas reflexões motivada pelos acontecimentos ocorridos na Inglaterra, seu país natal. Com o De Cive, o filósofo de Malmesbury pretende tornar a política uma verdadeira ciência, ou melhor, a ciência política. Sobre a ciência política, Hobbes assevera não ser mais antiga do que o De Cive.
Diferentemente do Leviathan, o De Cive foi redigido em Latim e é dirigido a um público mais refinado, ou seja, culto. Como consequência, a obra possui um estilo mais acadêmico do que o Leviathan, enfatizando, sobretudo, um itinerário de demonstração mais elaborado capaz de oferecer uma leitura mais coerente da filosofia para uma melhor fundamentação política.
Na verdade, o texto do De Cive apresenta a artimanha de Hobbes para elevar os conhecimentos da política, ou seja, aquelas categorias humanas a um conhecimento dedutivo, tal como Euclides, nos Elementos. Com isso, Hobbes pretende inserir a ação humana no método dedutivo capaz de entender as relações sociais políticas dos homens no âmbito do critério de demonstração, tal como a física. Segundo Hobbes, para conhecer algo é necessário entender os elementos que o compõe. Só assim é possível conhecer suas regras de composição.
Nesse contexto, a ênfase será compreender a natureza humana ou o modo natural dos homens para, como nesse entendimento, poder provar a necessidade de geração do Estado. O pressuposto fundamental de Hobbes, no De Cive, será de evidenciar que a instituição da sociedade civil corresponde ao medo recíproco. O medo da morte corresponde a uma paixão que motivam os homens a buscarem a paz. No De Cive, Hobbes afirma ser o medo recíproco como o início da sociedade civil: “Devemos, portanto, concluir que a origem de todas as grandes sociedades não provém da boa vontade recíproca que os homens tivessem uns para com os outros, mas do medo recíproco que uns tinham dos outros” .
Se o medo é uma paixão motivadora para a instauração do Estado, a sociabilidade humana não pode ser compreendida como natural, mas artificial capaz de garantir o estabelecimento da paz e a manutenção da vida de cada um dos homens que o compõem enquanto súditos ou cidadãos. O Estado apresenta-se como um artificio, um produto dos homens em vista a sua segurança e a paz. Por sua vez, a obediência dos súditos ou cidadãos ao poder soberano estará sempre condicionada às condições requeridas para a conservação da vida e a obtenção da paz.
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Delmo Mattos é Doutor em Filosofia pelo Programa de Pós-Graduação em Filosofia pela UFRJ e Professor do Departamento de Humanidades do ITA. Coordena o GT Hobbes da ANPOF. Publicou os livros O problema da liberdade e a liberdade como problema em Thomas Hobbes (EDUFMA, 2023) e Pactos, palavras e ações em Thomas Hobbes (Editora Dialética/2020).
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