Comunidade

Por: Marcos Ramalho

Comunidade
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Sobre a edição

Os leitores de Henri Nouwen (1932-1996) podem festejar. Editora Vozes trouxe a público Comunidade, uma coleção de textos do autor holandês que é considerado por muitos como um dos grandes nomes contemporâneos da espiritualidade.

Embora a necessidade humana de comunidade fosse um tema importante para Henri, ele mesmo nunca publicou um livro sobre o assunto. Contudo, ao longo de sua caminhada como padre, escritor e conferencista, Henri muito escreveu e falou sobre esse aspecto que considerava ser essencial e integral, não só da vida humana, mas também da vida espiritual. Comunidade, portanto, é uma “obra póstuma”, que recolhe muitas das reflexões do autor a respeito do tema. Ela sintetiza sua própria busca por uma comunidade, o que o levou a tantos lugares até encontrar o desejado acolhimento junto aos amigos e companheiros da Comunidade de Daybreak.

Editada por Stephen Lazarus, pesquisador da Henri Nouwen Society, e publicada no mercado norte-americano em 2021, a coletânea abrange um período de quase três décadas, reunindo textos dos tempos em que Nouwen lecionava na Universidade de Notre Dame, nos Estados Unidos, até o momento em que deixa o universo acadêmico para viver a transformadora experiência junto aos deficientes de Daybreak, no Canadá.

A obra está dividida em 10 ensaios, sendo quatro deles inéditos para o grande público. Stephen optou por uma apresentação didática: com exceção de um, os demais ensaios são apresentados em ordem cronológica, o que permite aos admiradores do teólogo acompanharem o aprofundamento de suas reflexões sobre o tema. Além disso, cada ensaio é precedido por uma pequena nota do editor, que oferece aos leitores o contexto de cada reflexão. A edição brasileira conta ainda com a tradução clara e fluída de Luis Gonzaga Fragoso.

Sobre o conteúdo

Do primeiro ao último ensaio, Henri nos oferece uma espiritualidade para a vida em comunidade – ou, ainda, por uma vida em comunhão. Toma por princípio o que todos já sabemos: ansiamos por habitar uma comunidade (a família, os amigos, a comunidade religiosa etc.) e, exatamente por isso, machuca-nos constatar que a comunhão ardentemente desejada traz à superfície todas as nossas imaturidades emocionais e espirituais, as nossas mesquinhezes e as nossas rivalidades.

A partir dessa simples constatação o autor expõe, de forma muito clara, as riquezas e os desafios que a vida em comunidade apresenta ao desenvolvimento afetivo, emocional e espiritual de toda pessoa. Evocando muitas vezes suas alegrias e as próprias dificuldades, Henri descreve as armadilhas emocionais e espirituais que dificultam nossa caminhada espiritual e nossa vida em comunidade, clarificando ainda como a riqueza dessa experiência é dificultada pelas culturas individualistas e competitivas que moldam nossas sociedades e, consequentemente, nossas vidas.

Henri, obviamente, não se limita a expor nossas limitações; convida-nos a percorrer um caminho de conversão e de amadurecimento. Sua visão é esperançosa. Para ele, a comunidade pode ser o espaço para uma vida fértil e frutuosa desde que aprendamos a reconhecer que somos filhos e filhas de um Deus amoroso e desde que aprendamos a acolher e a perdoar as nossas fragilidades – as nossas e as dos que convivem conosco. Somente ao aceitar que somos todos parte da família humana, bastante imperfeita, é que poderemos celebrar os dons e os talentos que cada um pode oferecer, crescendo e amadurecendo como seres humanos e como filhos e filhas desse Deus que nos amou por primeiro e quis habitar em nosso meio.

Por que ler?

A leitura de Comunidade pode ser especialmente interessante após as rigorosas disciplinas de isolamento ou de afastamento social que nos foram exigidas durante os momentos mais críticos da pandemia de Covid-19. Ficou muito claro que não fomos feitos para o isolamento, ou para a solidão; contudo, a convivência com outras pessoas sempre foi e, talvez, sempre será um imenso desafio para nós. Henri nos ajuda a compreender espiritualmente essa nossa necessidade e os desafios aí implicados.

Henri também pode nos ajudar a cultivar uma espiritualidade mais acolhedora e mais generosa para com a nossa vulnerabilidade. Geralmente entendemos a nossa vulnerabilidade como um empecilho para a vida espiritual. Nouwen, por sua vez, nos ajuda a entender as fragilidades como parte de nossa caminhada espiritual – que, sendo acolhidas e trabalhadas, podem se tornar fonte para o desenvolvimento de pessoas e de relações mais amorosas, tolerantes e compassivas.

Outro ponto de destaque é que, ao explorar a sua transformadora experiência junto aos deficientes de Daybreak, Henri nos recorda esse desafio que ainda temos que é o de acolher as pessoas com deficiência – ou, ainda, o de acolher todas as pessoas que nos pareçam tão diferentes de nós. Ele nos lembra quanta riqueza existe na convivência com pessoas tão diferentes e, ao mesmo tempo, tão semelhantes a nós em suas necessidades e em suas capacidades.

Comunidade, finalmente, pode ser um livro oportuno para repensarmos nossas paróquias e nossas comunidades em tempos de mudanças tão profundas e tão aceleradas. Pode nos ajudar a reavaliar nossas catequeses e toda a evangelização nesse mundo urbano e globalizado que clama por acolhimento, intimidade e afeto.

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Marcos Ramalho é presbítero da Diocese de Limeira(SP). É graduado em Filosofia e Teologia pela PUC-Campinas e tem especialização em Counseling pelo Instituto IATES. Atua especialmente nas áreas de catequese, espiritualidade e aconselhamento pastoral. Pela Editora Vozes é co-autor dos livros “A vida em prece” e “Sabedoria Bíblica para Mulheres” e, há quase vinte anos, participa dos sazonais Meditações para o dia a dia e Folhinha do Sagrado Coração de Jesus.



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