5º Centenário do nascimento de São Benedito
“São Benedito, meu lindo amor, dai-me a sorte da vossa cor”
Frei Apolinário da Conceição, 1744
Há quinhentos anos, nascia na cidade de Palermo, atualmente território italiano, aquele que se tornaria o santo negro mais venerado nas Américas: São Benedito. Filho de pais escravizados de origem africana, pouco se sabe de sua infância e juventude. O que se conhece, a partir das primeiras biografias escritas sobre ele é que ainda jovem ingressou em um grupo de eremitas franciscanos e terminou seus dias no convento de Santa Maria de Jesus, da Ordem dos Frades Menores. Logo depois de sua morte, sua fama de santidade se espalhou pela ilha Siciliana, mas ele ficou mesmo conhecido foi no vasto território colonial ibérico que ia do atual sul dos Estados Unidos até o extremo sul da Argentina. Antes mesmo da beatificação (1743) e da canonização (1807) dentro dos tramites legais da Igreja Católica, Benedito já era cultuado nas Américas do Norte, Central e do Sul, entre os africanos escravizados e seus descendentes.
No Brasil, de modo particular, São Benedito e outros santos negros, foram “utilizados” pelos colonizadores no processo de catequese da população negra escravizada nestas terras. Não à toa, a primeira biografia em língua portuguesa escrita sobre o santo é de autoria de um frade português, Frei Apolinário da Conceição, que vivia no Brasil e pertencia a Província Franciscana da Imaculada Conceição. Menos à toa ainda é a temática central do livro escrito por ele: “Flor perigrina por preta, ou nova maravilha da graça. Descuberta na prodigiosa vida do B. Benedicto de S. Philadelfio”: a cor da pele preta. O frade, citado na epígrafe deste texto, ressalta já na dedicatória de seu livro, a temática que norteava questões sociais, políticas e econômicas da sociedade colonial brasileira no século XVIII: a questão da cor.
A estratégia de catequização dos negros escravizados através de santos pretos, tendo como um dos critérios a questão epidérmica, deu origem a diversos grupos de organização social como as irmandades dos homens pretos, as congadas, as marujadas, os moçambiques, entre tantas outras. Tais grupos, bem como suas festas e religiosidades, moldaram a sociedade brasileira e, nos dias atuais, representam a força da ancestralidade. Tendo em Benedito um modelo a ser seguido, os homens e mulheres “de cor”, como eram chamados, elaboravam estratégias de sobrevivência, alimentavam sua fé, rezavam pelos seus mortos, enfim, se reorganizavam e se reinventavam.
O livro “Um preto no altar” conta a história de um destes grupos: a irmandade de São Benedito do Largo São Francisco em São Paulo. História esta que se assemelha a muitas outras espalhadas pelo Brasil afora, marcada por luta, resistência, protagonismo e identidade religioso-cultural. Em torno da devoção ao santo preto Benedito, incentivada primeiramente pelos frades franciscanos, os confrades de São Benedito do Largo São Francisco marcaram sua história e deixaram um legado ancestral no centro da capital paulista. A tentativa de apagamento de suas memórias, no início século XX, não conseguiu esconder os mais de oitenta anos em que eles estiveram à frente dos cuidados da Igreja de São Francisco do centro de São Paulo.
Transcorridos quinhentos anos desde o seu nascimento, Benedito de Palermo, bem com as irmandades a ele dedicadas, continuam a ser sinônimo de determinação, persistência, resistência e protagonismo. Na busca de um mundo necessariamente mais igualitário e antirracista, Benedito é sinal de esperança.
Afirmam os frades franciscanos da Província da Sicília, a mesma onde viveu Benedito: “Neste mundo e neste tempo em que centenas de milhares de pessoas fogem dos seus países de origem forçadas pela fome, pelas condições de vida extremas, pela exploração, pela falta de liberdade, de água, e de trabalho, em busca de dignidade, de respeito e de uma vida digna de condições humanas, ou arrancados do afeto dos seus entes queridos para serem escravizados, encontrando muitas vezes violência, exploração e morte no deserto ou no mar, Benedito é uma figura de extraordinária relevância, um símbolo de esperança, de redenção, de acolhimento e de integração. A celebração do quinto centenário do seu nascimento constitui uma oportunidade providencial para redescobrir a figura do Santo Mouro e a relevância da sua mensagem de solidariedade, de fraternidade e de diálogo para o mundo multirreligioso, multicultural e multiétnico em que vivemos, dilacerado pelo racismo e pelas discriminações, pelas guerras e pela violência, afligido pela antiga e pela nova escravidão, mas sedento de liberdade, de paz, de fraternidade e sobretudo de espiritualidade”.
Salve São Benedito!
_______________________________________________________________________________________
Compartilhe nas redes sociais!
Comentários
Seja você a fazer o primeiro comentário!