Alma brasileira e folia de reis - Por uma ética da irmandade
Neste livro, Alma brasileira e folia de reis – Por uma ética da irmandade, Humbertho Oliveira começa por revelar o quanto e como os santos reis estão com ele desde pequeno. Nascido num bairro popular de uma cidade do interior do estado do Rio de Janeiro, onde a cultura popular insistia, relata uma primeira visita de uma folia de reis ainda em sua infância, enfatizando a experiência do completamente novo.
Referindo-se a toda sua relação pessoal, profissional e de prática ritual com as manifestações da folia de reis, o autor nos apresenta a sua pertinência à Cantoria de Reis do Céu na Terra, um grupo de artistas da cultura popular que realiza anualmente, há mais de 20 anos, a prática das visitações de folia no período natalino/ano novo.
Partindo daí, Humbertho abre o campo das manifestações culturais da alma brasileira. Visita e compartilha o Saci menino na busca de um devir criança, o Curupira no caminho do que é contrário, a mítica do Bumba-meu-boi entrelaçando o nosso sagrado e o nosso profano.
Nesta bela tessitura, o autor sustenta a ideia de como as folias de reis, com suas músicas, danças e rituais, podem oferecer um cuidado terapêutico tanto para os que participam quanto para os que assistem. Para isso, nos recorda as raízes históricas das folias de reis, explorando os aspectos éticos e culturais da narrativa mítica, nos lembrando como essas manifestações, trazidas pelos portugueses, foram abraçadas pelos escravizados no Brasil.
Humbertho nos oferece, nesta obra, uma lente inovadora que enxerga os mitos como narrativas construídas pela artesanalidade dos povos. Tudo leva a crer que é o povo, na sua experiência artesanal, que nos oferece sempre as grandes narrativas, as grandes histórias, os mitos.
O autor, como um apóstolo das convergências, de todas as raízes mais profundas, telúricas, intensas, populares aqui nos apresenta as origens de nossas vozes brasileiras. Trata-se de um livro emocionante: a ideia de Brasil e a vocação das almas, os corpos luminosos e a conquista do espaço. Humbertho traduziu, através de suas cordas – o timbre e a viola, a pesquisa e a intuição – os mitos que arrebatam a nossa aldeia.
Este livro nos convida a compreender os aspectos éticos das práticas da cultura popular, especialmente aqueles ligados à importância do cuidado e da compaixão, e também nos demonstra como a prática das folias é uma forma de resistência ao poder sem legitimidade e uma busca pela autorregulação e ressonância com outros corpos.
Argumentando a respeito da manifestação arquetípica da comunhão na simbologia da Irmandade, o autor nos enriquece transitando por noções fundamentais a respeito do inconsciente cultural, da individuação, da ética da virtude. Assim, nos convoca ao longo do livro a praticarmos a costura entre a noção de um outro-mesmo com a definição de um si-mesmo com a perspectiva de propor a nos abrirmos a explorar e a valorizar percepções valiosas sobre a natureza humana e a vida coletiva.
Humbertho, neste livro, nos convida a conscientizar nossas ricas raízes multicoloridas dessa imensa árvore de ramagens densas, guardiã de nossa memória ancestral. Com a sensibilidade fina, resultante de rica integração de músico e psicólogo junguiano, nos conduz pela mão para adentrar uma casa de imagens e vivências, como se estivéssemos, nós mesmos, vivendo uma Folia de Reis, e renascendo no Deus menino.
Numa conversa entre conhecimentos da psicologia de Carl Gustav Jung, os estudos etnográficos acerca das folias de reis dos antropólogos Wagner Chaves e Carlos Brandão e do projeto de uma ética da virtude baseada em Frederick Nietzsche defendido por Christine Swanton, este livro nos leva a uma experiência de leitor na direção do pensamento e da vivência mítica.
Compartilhe nas redes sociais!
Comentários
Seja você a fazer o primeiro comentário!