A história das emoções sob três perspectivas

Autores apresentam as emoções dá antiguidade às luzes, das luzes ao final do século XIX e deste aos dias atuais

História das Emoções é uma obra constituída em três volumes, sob a direção de Alain Courbin, Jean-Jacques Courtine e Georges Vigarelo. Os livros estão na esteira de duas outras coleções dos mesmos diretores – História do Corpo (2008) e História da Virilidade (2013) – todas publicadas no Brasil pela Editora Vozes.

Neste trabalho, empenha-se em demonstrar que, mesmo com a impressão de que as emoções se enquadrem no campo do atemporal ou universal, elas na verdade possuem modulações em cada época, variando de acordo com os indivíduos, refletindo em primeiro lugar a cultura de cada tempo.

Box com as três obras

Os diretores da obra reconhecem Lucien Febvre como um dos pioneiros em propor uma pesquisa no âmbito da “história dos sentimentos”, sugestão esta que desencadeou outras tantas iniciativas nesta mesma senda – como a história das mentalidades – , a ponto de ganhar contornos, cada vez mais nítidos, de um campo disciplinar. Confessam que, o interesse pelo tema das emoções se coadunou com os supracitados trabalhos anteriores e que, do corpo à virilidade, esta obra sobre as emoções vem completar os estudos anteriores de modo a apresentar, na perspectiva de uma genealogia, o ser humano enquanto corpo, inscrito sexualmente e com uma vida afetiva. “Nossa ambição – afirmam os diretores – é seguir passo a passo a presença da emoção na história e medir a espessura que ela pode dar ao tempo, seu impacto sobre a sensibilidade, a cor e a tonalidade que ela pode oferecer a cada formação cultural.”

Os três volumes da obra dividem-se da seguinte forma: O primeiro, dirigido por Georger Vigarello, abrange um período de tempo que vai da Antiguidade até às Luzes; o segundo, que tem por diretor Alain Corbin parte do período das Luzes e abarca o final do século XIX; por fim, sob a direção de Jean-Jacques Courtine, o terceiro volume percorre todo o século XIX e XX, até chegar aos nossos dias.

Segundo Francisco Morás, um dos tradutores da obra, “Talvez a maior riqueza desta obra esteja em sua abrangência temática.” Ele explica que, embora a análise seja escrita desde o ponto de vista do historiador, este olhar se torna interdisciplinar visto que aborda as emoções nos mais diferentes campos do saber e do fazer humanos: “ele vai da política à religião, da família às aglomerações das praças, da literatura ao teatro, da pintura aos discursos acadêmicos, da música à poesia, da guerra aos armistícios. Tudo isso para mostrar os diferentes olhares pousados sobre aquilo que “move” o ser humano: a emoção” – comenta.

Perguntado ainda sobre os destinatários da obra, indica: “vista na perspectiva acima, esta obra se destina a todo aquele e aquela que se interessa por um ou vários desses olhares. Ela se destina, pois, ao historiador, ao psicólogo, ao pedagogo, ao músico ou poeta, ao pintor ou portador de uma sensação espiritual, mística ou religiosa. Enfim, como diria Martial Guédron, um dos autores, – conclui Morás – essa obra interessa a todo aquele que sente “emoções, paixões e afetos”, mas que está sedento por saber como, ao longo da história, elas foram se manifestando e foram interpretadas nos mais diferentes campos da vida humana. ”

  1. Dá Antiguidade às Luzes

Primeiro volume de História das Emoções vasculha a Antiguidade com o objetivo de perseguir as origens do que hoje temos por emoção.

O que os filósofos da Antiguidade Clássica falaram sobre o assunto? Onde e quando nasceu o termo emoção? Como se expressava o homem medieval? Havia espaço para a emoção no projeto da razão que chamamos Modernidade? São perguntas que permeiam este volume de História das Emoções, onde aos poucos o leitor verá delineado a origem do próprio termo emoções, bem como se.

Instigante serão as descobertas proporcionadas pelos textos referentes a Idade Média: uma vivência das emoções desde o seio das famílias até as grandes cortes e principados, ou ainda da vida monacal à novidade apresentada por Francisco de Assis, por exemplo.

Pondo os olhos sobre a interdisciplinaridade, vemos os autores apresentando as compreensões  de emoção em cada época desde textos políticos até análises de peças de teatro ou teoria da arte e expressão, ou ainda, a título de ilustração, a emoção musical no período barroco.

2. Das Luzes ao final do séc. XIX

Este volume de história das Emoções inicia sua análise em 1730, um período que oscila entre a busca de emoções intensa e a valorização da sensação mínima. No texto se pode notar como se vai constituindo a alma sensível, como a história das emoções pode ser entendida em relação a fenômenos meteorológicos e paisagens naturais e como, de emoções meteorológicas se passou a emoções políticas, na revolução francesa, por exemplo.

A criação da guilhotina, a alfabetização e a leitura, as mudanças no ambiente familiar, bem como o avanço nas discussões sobre anatomia humana, a descoberta da ovulação e o estudo do orgasmo são todos fatores que esta obra investiga historicamente como objetivo de oferecer uma visão ampla sobre as emoções e suas mudanças no correr do tempo.

3. Do final do séc. XIX aos dias atuais

Na busca da “História das Emoções”, o último volume chega ao período da pluralidade das ciências que estudam o ser humano. Agora, antropologia, pscilogia, neurobiologia e fisiologia tomam palavra para apresentar o ser humano, seu ambiente e, também, para relatar e analisar suas emoções.

É no início deste período (1880) que Charles Darwin pública “Expressão das Emoções no homem e nos animais”, cujo impacto pode ser considerado o pontapé inicial de uma ciência das emoções, que tem como pergunta inicial “What is na emotion?”, colocada em 1884 por Willian James, fundador da psicologia americana.

Assim, de Darwin e James, o terceiro livro de História das Emoções percorre o início do séc. XIX, as duas grandes guerras e as emoções presentes neste contexto, discute a questão familiar e escolar no contexto da infância, a presença dos animais como membros da família, até chegar em temas bem atuais como ansiedade e depressão.

Sobre os diretores:

Georges Vigarello, historiador e sociólogo, é diretor de estudos no Ehess e membro honorário do Instituto Universitário da França. Consagrou inúmeros trabalhos à história do corpo. Além de História do Corpo, História da Virilidade e História das emoções, publicou pela Vozes “O sentimento de si – História da percepção do corpo”, em 2016.

Alain Corbin é um historiador francês, professor emérito da Universidade Panthéon-Sorbone e do Instituto Universitário da França. Um especialista no século XIX e em micro-história.

Jean-Jacques Courtine é professor de História Europeia na Universidade de Auckland (Nova Zelândia), professor-emérito da Universidade Sorbonne-Nouvelle e da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara. Em 2018, foi professor-visitante da Leverhulme Trust de Queen Mary, Universidade de Londres. Publicou recentemente História da fala pública (com Carlos Piovezani; Petrópolis: Editora Vozes, 2015) e Déchiffrer le corps – Penser avec Foucault (Jérôme Millon, 2011), e dirigiu a publicação da Histoire du corps e da Histoire de la virilité (com Alain Corbin e Georges Vigarello; Seuil, 2005- 2006 e 2011 [História do corpo, 2011; História da virilidade, 2013, ambos publicados pela Editora Vozes]).