10 lições sobre Guerreiro Ramos

Por: João Marcelo E. Maia

 

Em ‘Dez Lições sobre Guerreiro Ramos’, apresento de forma sintética as principais contribuições do sociólogo brasileiro Alberto Guerreiro Ramos (1915-1982) para as ciências sociais no Brasil e no mundo. O livro faz parte da coleção “Dez Lições” da Editora Vozes, que apresenta introduções didáticas aos principais pensadores do mundo em dez capítulos.

Ao longo de dez lições, apresento um perfil intelectual e biográfico de Guerreiro, analiso algumas de suas principais obras, escritas fundamentalmente entre as décadas de 1940 e 1970, e argumento que Guerreiro produziu uma sociologia criativa, aplicada e periférica.

A primeira lição apresenta uma minibiografia de Guerreiro, destacando sua formação como estudante na Bahia, seu contato com o pensamento existencialista cristão, sua participação juvenil no integralismo e sua vinda ao Rio de Janeiro na década de 1940. O segundo capítulo mostra como Guerreiro tornou-se um sociólogo ‘aplicado’,  ocupando postos em agências do Estado como o Departamento de Administração do Serviço Público e o Departamento Nacional da Criança, nas quais buscava orientar o conhecimento sociológico para a realização de pesquisas sobre a condição de vida dos brasileiros e o planejamento da modernização nacional.

Em seguida, introduzo ao leitor as análises de Guerreiro sobre as relações raciais no Brasil e suas ideologias, elaboradas durante período em que o sociólogo baianocolaborou com Abdias do Nascimento e o Teatro Experimental do Negro (TEN). Datam desse período os seus primeiros estudos críticos sobre as ciências sociais brasileiras, que mostravam como muitos antropólogos de sua época viam a população negra como um ‘problema’. Nos capítulos 4, 5 e 6, analiso a crítica guerreiriana ao colonialismo intelectual que marcaria as sociedades periféricas, e que transformava a sociologia num tipo de saber ‘imitativo’, desprovido de relevância. Nesses capítulos, também exponho a resposta encontrada por Guerreiro, traduzida em seu grande livro de 1958, intitulado “A Redução Sociológica”. Essa obra apresenta um procedimento teórico-metodológico que permitiria aos cientistas sociais localizados na periferia do mundo mobilizarem o melhor das contribuições científicas feitas no Hemisfério Norte sem perderem de vista a originalidade e a busca pela autonomia política e intelectual.

Já nos capítulos 7 e 8, analiso os escritos de Guerreiro sobre nacionalismo e revolução, temas urgentes na primeira metade da década de 1960, e que conectavam o sociólogo brasileiro aos grandes debates propiciados pela descolonização na África e na Ásia. No capítulo 9, me dedico a analisar as ideias de Guerreiro sobre as organizações modernas e as teorias da administração de seu tempo, destacando tanto as críticas do sociólogo a um modelo de racionalidade que tolhia a liberdade humana como a alternativa proposta, baseada na teoria da delimitação dos sistemas sociais. No capítulo final,recupero os últimos escritos de Guerreiro sobre o Brasil e seu destino, produzidos durante seu breve retorno ao Brasil no começo da década de 1980, nos quais o sociólogo repassa suas principais ideias sobre colonialismo e vida intelectual.

Um dos destaques do livro é o capítulo 3, ‘Tornar-se Negro’, onde analiso as principais contribuições de Guerreiro para uma sociologia antirracista. O livro mostra como Guerreiro foi um dos primeiros analistas do que hoje entendemos por ‘branquitude’, tomando a brancura como uma ideologia colonial que transformava a negritude num ‘problema a ser explicado’ e ocultava o fato de que a maioria da população brasileira era não-branca. Outro destaque é o capítulo 6, integralmente dedicado ao livro ‘A Redução Sociológica’, em que detalho uma das obras mais complexas do autor de modo didático, expondo todas as leis da redução tal como formuladas por Guerreiro.

Dez Lições sobre Guerreiro Ramos’ é relevante por apresentar de forma clara e didática as ideias de um dos mais importantes sociólogos negros brasileiros, responsável por uma produção intelectual original e ousada. Em um momento de fortes críticas ao colonialismo e de buscas por teorias e ideias que não reproduzam o Eurocentrismo, a leitura dessa obra certamente servirá de inspiração para estudantes e professores.

 

 


João Marcelo E. Maia é professor associado da FGV CPDOC (Escola de Ciências Sociais) e dedica-se desde 2010 ao estudo de Guerreiro Ramos, já tendo publicado vários artigos e capítulos de livro sobre o autor. Além disso, João é vice-presidente do grupo de História da Sociologia da International Sociological Association (ISA) e editor-chefe da Revista Brasileira de Ciências Sociais.